quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Ela nasceu e eu renasci

   


   Era pra ser em agosto. Era pra ter data marcada. Era ser planejado. Mas não foi. Seria uma terça-feira qualquer em que eu acordaria cedo, tomaria banho e iria trabalhar o dia todo, mas não foi exatamente assim. Teria sido uma terça-feira de muitas pautas com a manhã light e a tarde corrida, mas não foi. 
   Naquela terça-feira, 12 de julho, eu de fato levantei cedo e tomei banho, mas algo estranho estava acontecendo e eu não sabia precisar, perceber ou explicar o que era. A manhã de fato foi light e eu apenas combinei detalhes das pautas da tarde com os colegas, jogamos um pouco de conversa fora e tive tempo de sobra até de tomar mate enquanto eu sentia contrações mas que, a princípio, não seria nada anormal para as 34 semanas e 3 dias de gestação. Ao final da manhã as contrações ganharam a companhia de uma dor que, opa, não parecia nada normal. 
   Assim que consegui contatar o meu médico ele me mandou ao consultório e de lá fui para o hospital pois eu estava com pouco líquido e o colo do útero "apagado". "Tu vai ser internada e até sexta-feira ela nasce." Essa frase mudou completamente os planos e me provou mais uma vez que muitas vezes eu vou perder o controle das coisas, eu vou perder o controle da minha própria vida. A tarde que seria de trabalho foi de soro na veia, de injeções, de exames e de um turbilhão de sentimentos. Até sexta ela nasceria, mas era pra agosto, era pra ser leonina, era pra ser tudo organizado, era pra eu entrar no hospital com malas e expectativas mas eu estava lá só com a roupa do corpo e muito medo. 
   Se é nos piores momentos que sabemos com quem contar eu posso afirmar que sou milionária no quesito amigos. Enquanto eu encarava a solidão do bloco obstétrico a notícia se espalhou, duas das minhas amigas mais prestativas e agilizadas, a prima que a vida deveria ter me mandado como irmã e a minha mãe correram pra providenciar as minhas roupas, a mala do bebê, as lembrancinhas (sim, elas pensaram até no que eu nem com tempo extra teria conseguido organizar), além do colo que elas sabiam que eu precisaria e não saberia pedir e do apoio que se faria tão essencial com o desenrolar dos fatos. O meu parceiro da vida, o pai da nossa Mel foi igualmente incansável e apesar dos olhos arregalados soube tentar disfarçar o nervosismo do susto que estávamos tendo. O celular tocou, as mensagens chegaram bem como as visitas e eu nos senti amadas, e eu fui inundada por muita coragem e pela certeza de que tudo daria certo. 
   A madrugada de terça pra quarta foi de dor, de muitas idas ao banheiro e de pouquíssimo sono. O amanhecer do dia 13, dia mundial do rock, foi de incerteza e de mais exames. Não seria aquele dia, o médico havia constatado que poderíamos esperar até sexta, ok, que seja então, apesar da dor e de sentir que nada estava bem eu teria que esperar. No intervalo do almoço uma grande amiga, uma quase irmã, foi me visitar e amarrou no meu pulso uma fitinha de Santo Antônio, aliás, era o dia dele, todo dia 13 é dele e a partir de então seria da minha Melissa também. Logo depois o "tampão" caiu e eu liguei pro médico que disse: "Então vamos fazer a cesárea hoje a tardinha." 
   Entre "até sexta ela nasce" e "ela vai nascer hoje" eu só tinha a certeza que ela tinha que nascer logo, ela não tava mais bem dentro de mim, mas ela nasceria de 34 semanas e estando com restrição de crescimento, então, era tudo incerto e a única certeza que eu tinha é de que encararíamos a UTI Neonatal mas a fé me fez sentir que tudo daria certo e seria só questão de tempo e ela estaria conosco. Não foi em agosto, foi em julho. Não foi leonina, é canceriana. Não foi de 38 a 40 semanas, foi com 34. Não foi conforme planejado, foi "a moda louco". 
   O dia 13 de julho jamais será o mesmo, mais do que dia do rock, mais do que dia de Santo Antônio, agora é o dia da Melissa, da nossa apressada Melissa. Depois da preparação, da anestesia e de ter todas as devidas camadas cortadas eram 19:20 quando ouvimos pela primeira vez o choro que mudaria o resto das nossas vidas, o choro que selaria para sempre o nosso elo de ligação, o choro que eu tive medo de não ouvir pelo tempo de gestação, mas ela chorou, eu também chorei, ela nasceu e eu renasci. Ela de fato foi pra UTI e eu só pude tocar ela com a ponta dos dedos, ela era minúscula e absurdamente linda. Ela tinha apenas 43 centímetros e 2030kg do mais puro amor que eu já tinha sido capaz de sentir. 
   No dia 17 de julho eu segurei ela nos braços pela primeira vez e eu chorei de novo, de emoção, de alegria, de medo porque eu sou tudo o que ela precisa por enquanto, eu produzo o alimento dela, eu sou o melhor colo que ela pode ganhar, eu sou o porto seguro dela, é minha a voz que ela é mais acostumada, é o meu cheiro que é capaz de acalmar ela, eu sou mãe, eu sou o que por muito tempo eu não sabia se queria ser mas agora eu apenas sou. Durante os 12 dias que ela teve que ficar na UTI eu tive uma força e uma fé que eu jamais imaginaria ter em qualquer outra situação. Eu fui forte por ela, eu me doei pra ela, eu esqueci que tinha um mundo aqui fora e me entreguei de corpo e alma pra cada segundo que me era concedido junto dela. 
   Ser capaz de gerar, ver crescer e parir uma vida foi sem dúvidas a experiência mais intensa e inesquecível da minha vida. Ela nasceu e eu renasci, eu me vi virar leoa, me vi ser absurdamente corajosa, me vi não me importando comigo e colocando alguém acima de absolutamente tudo e todos. Foi tão intenso que ainda parece sonho, o melhor dos sonhos, daqueles que a gente deseja nunca mais acordar. Eu ainda me pego olhando pra ela besta de amor, encantada como eu posso amar tanto a ponto de humanizar o amor. Ser mãe é tudo isso o que falam por aí e muito mais, é cansativo mas gratificante e graças a Deus esse é só o primeiro mês da maior jornada da minha vida. 
   
   

Um comentário:

Unknown disse...

Chorei amor puro em forma de lágrimas!