segunda-feira, 25 de abril de 2016

Dançar é um ato de cumplicidade

   


   Dia desses fui em uma festa particular aonde eu conhecia a dona da casa e no máximo mais duas pessoas, pois bem, cheguei eu bem grávida, sem tomar um único gole de álcool e confesso que sem muita vontade de estar lá também. Fui obviamente bem recebida e bem tratada mas ainda assim me sentia deslocada, foi como se a minha timidez da infância tivesse repentinamente voltado. 
   Logo eu que tenho facilidade em contar a vida pra operadora de caixa do supermercado, pro taxista, pro mendigo, enfim, pra qualquer um que me dê um simples oi, naquela noite não conseguia desenvolver um único assunto com absolutamente ninguém. Quando cheguei a banda que estava tocando tinha dado uma pausa, pois bem, logo eles recomeçaram a tocar e eu e a minha timidez que havia decidido ser parceira naquela noite sentamos e inevitavelmente viramos ferrenhas observadoras de tudo o que acontecia na volta. 
   A dona da festa insistiu em me chamar para a rodinha de amigas que dançavam animadas, porém, minha timidez venceu e continuamos sentadas. Enquanto olhava para aquela roda senti saudade da adolescência e das minhas amigas, aquelas meninas tinham olhares de cumplicidade e coreografias próprias que rendiam altas gargalhadas. Eu sabia que muitas daquelas músicas que tocavam eram, para elas, muito mais do que canções, tinham embalado romances, dores de cotovelo, festas inesquecíveis, enfim, era como se elas tivessem relembrando e tendo longas conversas sem dizer uma única palavra que não fosse parte das letras das músicas. 
   Naquela noite em que eu senti saudade das minhas amigas e da minha adolescência, resolvi levantar e dançar, ainda que fora da rodinha da cumplicidade. Quando as músicas "do meu tempo" tocavam eu fazia coreografias que provavelmente denunciavam a minha idade, porém, na minha cabeça passava um filme e eu agradecia por ter as minhas cúmplices parceiras dos palcos da vida até hoje. Tenho amigas com as quais eu converso pelo olhar ainda que fique meses sem ver, se estivermos ouvindo a mesma música uma em cada canto do mundo tenho certeza que estaremos fazendo as mesmas coreografias e tendo as mesmas lembranças. 
   Naquela noite eu desejei que a minha filha, a menina que cresce em meu ventre, possa viver a cumplicidade, que ela tenha muitas coreografias que rendam altas gargalhadas, que embalem lindas histórias e as mais inesquecíveis, porém passageiras, dores de cotovelo. Eu quero que a Melissa cultive tantas e tão maravilhosas amigas quanto as que eu tenho, que ela tenha uma amiga desde o colégio que, depois de muitas coreografias e festas, ainda divida com ela os prazeres e as dores da maternidade assim como eu tenho e me sinto uma mulher de sorte por isso. Que ela tenha uma turma de amigas que superem juntas os traumas da adolescência e que tenham uma ou várias músicas que embalem milhões de histórias e que elas possam depois ver os filhos crescendo juntos como eu imagino que será com a minha eterna e preciosa Cúpula. 
   Feliz de quem já coreografou com cumplicidade, de quem já segurou e teve quem segurasse os seus cabelos depois de abusar da bebida alcoolica, de quem riu da falta de coordenação da amiga e pensou: "que bom ter essa desajeitada na minha vida". Feliz de quem consegue admirar a roda de dança ao lado e consegue ver quanto amor tem em cada troca de olhares e em cada canção entoada com toda a força dos pulmões. Que o mundo tenha cada vez mais rodas de dança cheias de verdade, alegria e que elas perpetuem as mais lindas amizades. 


quinta-feira, 21 de abril de 2016

O positivo que mudou a minha vida

   



   Eu não quis ser mãe, por muito tempo eu não quis. Eu queria poder investir na carreira, viajar, ganhar o mundo. Eu não queria casar, por muito tempo eu não quis. Eu queria ter liberdade para dormir em Miami e acordar na Alemanha. Cá estou casada, com uma filha canina de dois anos e meio e uma humana a caminho. A gente não tem noção da vida até que começa a viver, a gente tem a maior facilidade de sonhar até que percebe o quão difícil é realizar. 
   Logo que repudiava o casamento, logo eu que criticava a maternidade encontrei neles a minha realização pessoal. A gente muda, a vida ensina, o destino por vezes enfia o dedo na nossa cara e nos desafia. 
   Quando eu adotei uma pequena bolinha de pêlos eu não podia imaginar o quanto ela iria transformar a minha vida, pois ela me tornou mãe e me mostrou que o amor é imenso e infinito. Quando eu decidi que queria sentir o amor crescer dentro de mim eu não podia dimensionar essa experiência. 
   O mês era agosto, a minha vida tava do avesso, eu tinha me despedido da minha segunda mãe, da pessoa que, junto com a minha mãe, mais me ensinou sobre a vida. No dia em que eu dei o último adeus pra minha avó algo mudou em mim, algo me fez querer entender quão maior poderia ser o amor que eu já tinha certeza ser infinito. Se eu quisesse gerar uma vida o meu filho já tinha um pai, eu só precisava me entregar e querer de verdade viver o que pra mim seria um enorme desafio, a maternidade. Agosto acabou e a minha cartela de pílula também, pedi a Deus que a vontade Dele fosse feita. 
   Entre agosto e dezembro eu me dediquei de corpo e alma para um concurso público e o resultado foi positivo, fui aprovada e era só esperar a nomeação. Dezembro chegou trazendo a aprovação e o desejado, porém ainda temido, positivo. Dia 22 completei 31 anos, dia 23 abri o envelope que continha o passaporte para uma nova vida, o positivo chegou. 
   Amigos, familiares e até o papagaio do vizinho nos parabenizaram e comemoraram, eu confesso que de lá pra cá a minha vida virou um turbilhão de sentimentos. Eu sou muito pé no chão pra me deslumbrar com algo que eu sei o quanto é difícil e quanta responsabilidade exige. Será que eu vou conseguir? Será que sou capaz? E no meio de tudo sinto um chute e vejo em uma tela um ser humano perfeitinho crescer dentro de mim. 
   Eu seria mãe de menino, eu sempre achei isso, até porque me julgava prática demais para ter paciência com o mundo feminino. Março chegou com a notícia de que, contrariando os meus "achismos", uma menina crescia em meu ventre. Desde então todos os dias são para imaginar como ela vai ser, do que vai gostar, será que vai ter o meu gênio (rogo a Deus que não), imagino o tanto que ela há de me ensinar e quanto estará disposta a aprender, sinto medo, amor, felicidade, tristeza, tudo isso junto com o tempo passando e o agosto chegando. Por ironia do destino (ou não), o mês em que a minha avó nasceu e morreu é o mês em que terei nos meus braços a minha Melissa. 
   Eu ainda não me sinto preparada, talvez nunca me sinta, mas me sinto disposta a aprender, a ensinar e a crescer junto com ela. A Amy já me ensina tanto que eu só quero me entregar de novo de corpo e alma pra essa nova experiência materna. Quero rever conceitos, quero não ter conceitos, quero sentir, amar, sonhar, viver e seguir tentando ser melhor todos os dias por mim, pela minha mini e desejada família e pelo mundo que merece uma versão melhorada de mim. Que seja de fato doce e linda apesar de difícil, e por vezes até cruel, a maternidade.