quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

O corte do cordão umbilical

   


   Quando a gente nasce uma das primeiras atitudes do médico é cortar o cordão umbilical e eu não lembro, mas acredito que não dói. A partir daquele momento estamos no mundo e o que nos ligava a nossa mãe é cortado. Mas esse é um corte simbólico, porque, quando tudo ocorre conforme o esperado logo voltamos aos braços de quem nos pariu e que é quem sempre vai tentar nos proteger de todo o mal custe o que custar, doa a quem doer. 
   Eu já relatei aqui em outro texto que custei para sentir que a Melissa era minha, mas hoje sinto como se ela fosse um dos meus pulmões ou o meu coração, eu preciso dela, ela é um pequeno e lindo pedaço meu no mundo. Pra mim o verdadeiro corte do cordão umbilical é a separação física entre mãe e filho. Eu fui só da minha filha durante seis meses, 24 horas por dia, todas as noites sem intervalo, mas tá chegando a hora de voltar a trabalhar, e passaremos mais horas por dia separadas e meu Deus, como dói pensar nisso. 
   Dói ver os filhos crescerem, posso afirmar que dói mais do que qualquer dor que um parto possa causar. É uma dor que fere mas que cura porque crescer é preciso. Nem todo mundo tem a sorte de ter uma mãe, alguns nem conhecem a própria mãe, outros são deixados por ela, alguns outros tem pouco tempo de convivência quando vivem a dor da separação. Eu sinto falta do meu trabalho, de fazer o que eu amo, de honrar a vaga que eu tanto lutei para conquistar, vai me fazer bem voltar, mas vai doer também. Vai doer não ser só da minha pequena e imaginar que ela pode pensar que eu não quero mais estar com ela. 
   Agora ela estará no mundo, apesar de eu ter total confiança tanto nas pessoas que ficarão com ela quanto na escola que escolhemos pra ela aprender e evoluir eu nem sempre vou poder proteger ela de algumas coisas e são coisas necessárias para que ela cresça e aprenda. Ela vai levar unhada de outra criança, ela vai ralar o joelho, vai ser picada por algum bicho, vai sentir saudade, vai passar mal com alguma comida e nada, absolutamente nada disso poderia ser evitado ainda que eu decidisse viver 24 horas grudada nela, mas tudo isso vai doer mais em mim do que nela. 
   Eu não vou estar lá mas eu sempre vou estar lá, uma mãe nunca se ausenta completamente, ela vai ficar junto com o meu coração. Ela logo vai começar a andar, vai ter vontades diferentes de tudo o que eu sonhei pra ela e talvez ela me cobre por alguns momentos em que eu estive ausente. A partir de janeiro nós teremos um imenso e novo desafio, precisaremos entender que somos uma da outra e sempre seremos mas algumas vezes a separação vai se fazer necessária e vai nos ajudar a crescer. 
   É por ti minha filha, é por nós e ainda que esteja doendo lá no fundo da alma eu sei que isso é o melhor. Vou me reencontrar, vou ali conversar com aquela mulher que não tinha filho e tinha somente sonhos, vou pedir que ela ajude a mãe que eu me tornei a ser cada dia melhor e me ajude a nunca esquecer que ela existe e precisa ser cuidada de vez em quando. Eu adoro desafios e vou começar 2017 com o maior deles até hoje, estar longe de um pequeno pedaço que saiu de mim e tem me ensinado tanto há quase seis meses. Que venha o novo ano, os novos desafios, a nossa nova realidade e que acima de tudo o amor prevalesça. Cortar o cordão umbilical dói mas também dignifica e ajuda a crescer. 

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

"Sou dela, sem ela não sou"

   


   Eu não sei bem se algum dia tive alguma pretensão com esse blog, mas hoje eu tenho. Hoje eu escrevo para que a minha filha saiba o que eu senti desde que soube da existência dela. Eu não quis ser mãe, por muito tempo eu não quis. Precisei perder a minha avó para sentir que eu precisava preservar esse imenso amor e precisava ter para quem ensinar sobre amor. 
   Desculpa filha, eu não tinha noção do que eu tava me privando. Quando me vi mãe da Amy, a minha primeira filha de quatro patas a mãe adormecida que vivia em mim foi aos poucos despertando. Há quem diga que são amores incomparáveis, eu afirmo que são muito semelhantes. Hoje eu mataria e morreria tanto pela Amy quanto pela Melissa. 
   Eu não te amei desde que li aquele positivo filha. Desculpa, mas aquele resultado me causou mais medo do que amor. Eu sentei no sofá olhei pra Amy e chorei. Chorei porque pensei: "Quem sou eu para ser responsável por outra vida?" Chorei de medo, felicidade, insegurança. A ficha não caiu ali, eu não amei naquele dia. Semanas depois no nosso primeiro encontro através de uma tela eu ainda também desconhecia o amor que seria capaz de sentir e foi assim por muito tempo. A barriga crescia, eu estava me transformando mas não tinha dimensão do quão melhor e mais eu poderia ser. 
   Tu nasceu e eu chorei. Tu te apressou e nasceu antes do tempo e o meu medo era não ouvir o teu choro, mas tu chorou alto e forte e as lágrimas escorreram. A doutora te mostrou pra mim com a pressa de quem precisa levar o paciente para a UTI e eu só soube dizer: "Ela nasceu roxa como eu." Disse isso e imaginei o que a minha mãe deve ter sentido quando me viu pela primeira vez. No outro dia eu te vi dentro de uma encubadora e eu ainda não te sentia minha. Os dias se passaram e no dia 17 de julho quando eu te dei o primeiro colo eu chorei (tu tem uma mãe tão durona quando chorona) e eu talvez tenha entendido um pouco da difícil missão que me foi confiada. 
   Hoje tu tá quase completando 5 meses e nós estamos nos entendendo muito melhor. Eu já sei que tu chora de sono, eu entendo que tu quer colo a toda hora, eu me derreto com o teu sorriso. Eu nem queria amamentar e hoje eu acho que é tu quem vai cortar esse nosso vínculo. Eu me rendi minha filha. Eu me rendi ao teu amor. Eu me rendi as lições que tu me ensina todos os dias incansavelmente. Eu já entendi que talvez eu mais aprenda do que ensine. 
   Eu me sinto completamente entregue a um amor que eu desconhecia, eu só sabia que lindo era ser filha de uma mãe espetacular mas eu não imaginava como podia ser mágico ser mãe. Eu "mordo a língua" todo o santo dia, me pego fazendo o que eu julgava, me pego fazendo planos que eu condenaria há meses atrás, me flagro rindo sozinha e chorando também. É um cansaço compensador, é um amor que transcende, é o melhor que eu posso ser e que me faz descobrir que o melhor ainda está por vir. Obrigada filha, obrigada por ter me escolhido, obrigada por ser tão minha e me falar tanto sem ao menos dizer uma única palavra. Hoje eu sou puro amor e se erro é na tentativa de ser mais, de ser melhor, de ser a mãe que eu tenho e a quem sou grata por chamar de minha. Vivo todos os dias para que sejamos grandes amigas e mesmo quando tudo parecer ter fim saibamos que temos uma a outra e nada mais importa.